Por Raphael Favilla
A preparação física é um aspecto crucial para o sucesso de um jogador de tênis, seja ele amador ou profissional. No entanto, as diferenças entre essas duas categorias são significativas.
O professor Eduardo Faria é um dos grandes nomes da preparação física para tenistas no Brasil. Com mais de 30 anos de experiência na área, Faria trabalhou com atletas de vários esportes, mas foi no tênis que profissionalmente se destacou. Tendo se especializando na modalidade em 1986, o preparador já trabalhou com centenas de tenistas amadores, juvenis e profissionais, incluindo nomes de peso como Fernando Meligeni, Flávio Saretta e Alexandre Simoni.
“Edu Faria é o maior preparador físico do Brasil, na minha humilde opinião. É o maior por que sabe mais? Pode até ser, mas é muito mais que isso. Ele participa e participou de todas as áreas fundamentais do esporte. Treinou grandes nomes, educou a molecada e os incentivou a tratar a preparação física como se deve tratar, é de time, generoso, participativo, amigo. Ele chora junto, comemora e nunca traz para si a vitória. Eu devo mais de 50% das minhas vitórias a ele. Me deixava voando, sempre 100% comprometido com o estudo, ética e trabalho”, conta Meligeni, que foi acompanhado por Eduardo pelo circuito mundial por vários anos.
Faria nos conta que a preparação física de um profissional começa ainda na infância. “A gente parte da premissa de que o profissional já passou por todas as etapas de desenvolvimento, certo? E isso começa muito cedo. O tênis é um esporte que requer coordenação, então normalmente é preciso começar cedo. Isso significa que o profissional teve experiência competitiva desde a infância e passou por todas as etapas do desenvolvimento até chegar onde está agora. Então, nessa fase, ele já tem a formação completa”, lembra o responsável pelo treinamento físico da equipe brasileira da Copa Davis.
Por conta disso, a preparação física do tenista profissional é muito mais específica e envolve uma equipe multidisciplinar, que inclui preparador físico, preparador técnico, fisioterapeuta, nutricionista e psicólogo. “São esses cinco pontos que eles possuem para ter suporte no desenvolvimento competitivo. Para determinar o caminho a ser seguido nas competições, o profissional se baseia em avaliações físicas, técnicas e psicológicas”, destaca o autor do livro Tênis & Saúde, e idealizador do programa TFI – Treinamento Físico Inteligente, direcionado a amadores e profissionais de tênis que queiram evoluir fisicamente (saiba mais sobre o treinamento acessando o portal Quinto Set)
“O objetivo é alcançar a vitória, o sucesso e o rendimento. Tudo é específico de acordo com o estilo de jogo, o piso em que vai jogar e as necessidades físicas e técnicas do jogador. Tudo isso é trabalhado visando a competição semanal e a programação do trabalho é essencial. Geralmente, a competição é cem por cento, então é necessário ter um volume de trabalho adequado para chegar a esse ponto. A integração do treinamento físico com o técnico é muito importante e determinante para o sucesso. É preciso pensar nas cargas de treino e nos volumes de trabalho para chegar ao rendimento total. É assim que o profissional trabalha, tendo todo esse suporte para alcançar o sucesso”, continua.
Se por um lado o objetivo final do tenista profissional é obter a vitória, o sucesso e o rendimento máximo nas competições — o que requer uma programação cuidadosa do trabalho para atingir a performance máxima a cada semana -, com o tenista amador as metas são outras.
A preparação física para jogadores amadores de tênis requer atenção especial para evitar lesões e melhorar o desempenho nas quadras. Segundo Faria, é necessário avaliar o histórico esportivo de cada um, e criar uma programação de treinamento físico específica e adequada para cada caso.
“É necessário pensar no âmbito amador e analisar o histórico esportivo desse amador. Esse é o primeiro ponto que devemos pensar e analisar: ele tem um histórico esportivo? Ou não praticou muito esporte na vida, e é apenas um apaixonado por tênis, tendo começado a praticar a modalidade recentemente? Devemos tomar alguns cuidados, pois o tênis tende levar o jogador sempre ao seu máximo, levando o corpo ao limite, o que aumenta o risco de lesões”, alerta.
“Portanto, o amador precisa se planejar, fazer uma preparação física para melhorar o desempenho no jogo. Para isso, ele precisa contratar um profissional competente para trabalhar com ele fisicamente, ter uma noção de nutrição e procurar um nutricionista. Além disso, deve ter um fisioterapeuta que possa fazer uma reabilitação preventiva, um trabalho de massagem, pelo menos duas vezes por mês”, continua.
“É importante que o amador tenha um calendário pré-determinado para que possa fazer uma programação de acordo com suas exigências. Se ele é um amador competitivo, deve ter um calendário definido para se unir ao treinamento dele, pois ele tem um volume de atividades que precisa se unir ao treinamento. Os componentes físicos do tênis são força e potência, mas ele também precisa ter um aporte na condição cardiovascular e mobilidade articular para transferir isso para o jogo e ter um bom desempenho. Além disso, o trabalho cardiovascular é muito importante para o amador, pois dá suporte e melhora a recuperação dos pontos e dos jogos. Normalmente, o amador joga nos fins de semana, jogando duas vezes no sábado e duas vezes no domingo, e isso pode sobrecarregar o corpo”, explica.
Além de explicar as diferenças de tratamento no trabalho realizado entre profissionais e amadores, Faria respondeu a outros questionamentos sobre preparação física. Confira:
Quando falamos em preparação física voltada para o tênis, quais orientações sofreram mudanças ao longo dos últimos anos?
Se fizermos uma retrospectiva desde o final dos anos setenta até os anos oitenta, percebemos que foi nessa época que começou a ser dada ênfase à preparação física. Veio o Borg. Veio o Landl. Naquela década era o “tênis força”. E foi nesse contexto que se viu muitos trabalhos focados na preparação física, como, por exemplo, o trabalho do Lendl, que corria em montanhas, repetia o treinamento de Stallone, cortava lenha, etc. Pois se pensava que o tenista deveria ser forte, com uma musculatura volumosa, dada a característica do esporte. Naquela década, houve todo um trabalho empírico que vinha, normalmente, dos meios de atletismo, pois se pensava que o tenista precisava ser forte, dada a característica do esporte, que envolve força e velocidade. Também enfatizavam a necessidade do trabalho de corridas de longas distâncias. Assim, o “tênis força” foi um grande ponto na preparação física do tênis naquela época.
A partir dos anos noventa, as coisas começaram a mudar com a inserção da medicina esportiva e da fisioterapia, bem como dos meios de recuperação. Passou-se a ver o ser humano como um todo e começou-se a dar ênfase à recuperação pós-exercício, aos trabalhos preventivos de lesão e ao equilíbrio muscular. Esse é um ponto importante, pois as lesões são o grande fantasma do tenista. Além disso, a preparação física começou a se tornar mais específica devido à mudança na velocidade do jogo. O desenvolvimento das raquetes, do encordoamento e das cordas fez com que o tênis se tornasse mais rápido, encurtando o tempo do jogo. Assim, o corpo teve que se adaptar a essa mudança e, com isso, começou-se a dar mais ênfase aos trabalhos que envolvem transferência de peso e jogadas mais rápidas e próximas à linha. Jogadores como Agassi e Serena Williams deram início a esse tipo de trabalho físico.
Hoje vemos jogadores profissionais se aposentando cada vez mais tarde…
A integração do trabalho físico com o trabalho fisioterápico e com a medicina esportiva objetivou mais o trabalho e o tornou mais específico. Com isso, aumentou a longevidade do esporte, já que como se cuida melhor do corpo e evita mais lesões, há mais condições de jogar mais. A importância da recuperação pós-exercício e a direção mais específica do trabalho físico se refletem dentro da quadra, melhorando a transferência do treinamento para a prática. Isso aumentou a longevidade do esporte, pois hoje é possível jogar mais tempo, mais velho, utilizando esses meios.
Os meios de mobilidade articular, os exercícios de liberação miofascial e a própria nutrição também ajudam na recuperação. Além disso, a fisioterapia com os meios de recuperação, como massagem, manipulações, o trabalho de Pilates, ioga, entre outros, entraram na caixa de ferramentas do treinamento físico e ajudam a aumentar a longevidade desse esporte.
Existem diferenças na preparação física praticada no Brasil e no resto do mundo?
Existem muitos preparadores físicos bons aqui no Brasil que fazem um excelente trabalho na base. A preparação física hoje é global e tem muito conteúdo a ser estudado, muita gente pesquisando. Nas escolas americana, canadense, europeia e australiana, existe muito material para se pesquisar e hoje o acesso é muito mais fácil com a internet. Existem muitos cursos na área da preparação física que agora são mais acessíveis. Nos clubes, existem grandes preparadores físicos. Então, a preparação física que é feita no Brasil não deve nada para o resto do mundo. Haja vista o que está acontecendo com a Bia e com todos esses jogadores, na simples ou duplas, que estão tendo êxito. Logicamente, você tem que pesquisar, a curiosidade te leva ao conhecimento. Hoje, com muito mais acesso, o preparador físico que quer se especializar consegue com muito mais facilidade do que antes.
O trabalho direcionado aos homens é o mesmo empregado com as mulheres?
Logicamente, as demandas do esporte, as demandas do tênis são as mesmas, certo? Hoje em dia, se você vê o jogo feminino, é um jogo potente, é um jogo rápido, é um jogo que necessita que você tenha os desenvolvimentos harmoniosos das capacidades físicas a serem trabalhadas. A diferença entre homens e mulheres são os ciclos menstruais. A mulher tem uma característica de ter todo mês os ciclos menstruais, e é aí onde você tem que encaixar o treinamento para o melhor rendimento dela. Mas, no geral, o que se faz com o homem se faz com a mulher também. Todo tipo de trabalho, mas somente esse detalhe dos ciclos menstruais que difere o treinamento da mulher do treinamento do homem.
Foto de capa: Rubens Lisboa/CBT